terça-feira, 28 de agosto de 2012

MATEANDO Glaucus Saraiva

Quando a saudade maleva
Guasqueia forte o meu lombo
De supetão dou-lhe o tombo
E espanto a guecha algariada,
Numa charlita animada
Com a boca de meu porongo.

 Muitas vezes, tironeando,
Busco a sombra do galpão
Vou remechendo um tição
Acordo as brasas soprando,
E a chama vai levantando
Do "pai-de-fogo" no chão.

Chego a brasa no crioulo,
Depois encosto a chaleira,
Vou direito à prateleira
E com carinho destampo
A lata, cheiro de campo,
Da erva boa da Palmeira.

Palmeio o velho porongo,
Derramo a erva com jeito,
Encosto a cuia no peito,
Batendo a erva pra um lado,
Com os dedos enconchados
Formo um topete bem feito

Com um pouquinho de água morna
Que despejo com cuidado,
Tenho o amargo ajeitado
Que ponho a um canto, pra inchar
Espero a água esquentar
Pitando um baio sovado.

A pava chiou no fogo,
encho a cuia que promete
A espuma se arremete
Vem pra cima borbulhando
E acariciante, beijando
Engrinaldeia o topete.

Agarro a bomba de prata
Tapo o bocal com o dedão,
Calço o bojo no chão
Da cuia e vou destampando
Um pouco do chimarrão.


Derramo outro tanto d’água,
O que ainda aumenta o calor
E o mate confortador
Vou sorvendo em trago largo,
Pois me saiu um amargo
Despachado e roncador
  
Encho outra vez o porongo
Vou tragueando lentamente
E escuto nitidamente,
Como um chamado ancestral,
Um murmúrio paternal
Falando na seiva quente:

"Meu filho, levanta a testa,
Porque a vida é um desafio
Se o teu presente é sombrio
E já sentes, mermando,
Teu coração balanceando
Dentro do peito vazio.

Se amores e ideais alçadas
Muito te custa esquecer
E se estás a envelhecer
A mocidade chorando
Não esquece que, lamentando
Jamais o fará volver.

Se pelecharam teus sonhos
Amananciados em criança;
Se assististe à matança
De tua última ilusão,
Nota bem o chimarrão
Tem o verde da esperança.

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